Se aprovado, administradores poderão restringir utilização de áreas comuns e proibir reuniões
Um projeto de lei que estabelece novas regras nas relações de direito privado durante a pandemia do coronavírus pode, entre outras coisas, dar ainda mais poder aos síndicos de condomínios.
Um dos artigos do texto aprovado nesta sexta-feira no Senado Federal prevê, em caráter emergencial, que cabe a esses administradores restringir a utilização das áreas comuns para evitar a contaminação da Covid-19, além de proibir a realização de reuniões e até mesmo o uso dos abrigos de veículos por terceiros, inclusive nas áreas de propriedade exclusiva dos condôminos.
Para quem está na linha de frente da administração condominial, o reforço de poder será bastante útil neste momento, como afirma o síndico profissional Antonio Carlos De Luca.
Ele atua em oito endereços diferentes e diz que, de uma maneira geral, os moradores estão colaborando com as recomendações de segurança amplamente difundidas pela mídia. Mas há exceções.
Escola Pública:
Ministério Público do Rio recomenda a suspensão das aulas à distância no estado – É uma minoria que não ajuda. E, dentro desse grupo, a ocorrência mais frequente diz respeito a pessoas que não querem abrir mão de serviços dispensáveis, como obras não emergenciais em seus apartamentos.
No domingo passado, recebi reclamações acerca de um morador que levou profissionais para dentro do seu imóvel para a instalação de um guarda-roupa. Acho que será interessante termos esse respaldo para lidar com esse tipo de situação – comenta.
De autoria do Senador Antonio Anastasia (PSD/MG), o projeto reúne sugestões do presidente do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli, e segue para análise na Câmara dos Deputados. As regras propostas também precisam ser sancionadas pelo presidente Jair Bolsonaro.
No que diz respeito à atuação de síndicos, o advogado especialista em direito imobiliário Armando Miceli afirma que, caso o texto seja aprovado, esses administradores terão, de fato, a sua capacidade de ação ampliada. Ainda assim, ele faz uma ponderação:
– Não é nada que já não possam fazer hoje. Só que, agora, isso se dará com amparo legal.
Solidariedade:
Cariocas fabricam e doam máscaras artesanais para proteger população mais pobre do coronavírus O próprio advogado é sindico de um prédio de nove apartamentos no Leblon e, na última quarta-feira, determinou que trabalhadores de uma obra não emergencial não poderiam mais entrar no endereço. Ele tomou a atitude após reclamações de alguns moradores.
– Entendo que numa situação de calamidade, o síndico pode sim estabelecer regras do interesse da coletividade – afirma.
Na avaliação do síndico Lucas Tostes, que atende a dez condomínios, o trecho do texto que prevê restrições no uso das áreas comuns será muito útil. De acordo com ele, nos primeiros dias de recomendação de isolamento social aos que podem permanecer em casa, muitos moradores não queriam abrir mão de instalações como academias e parquinhos.
– Em alguns casos, tivemos que trancar esses espaços. Teve um dia que cheguei num prédio, e a brinquedoteca estava lotada de crianças. Com essa determinação definida, acho que será mais fácil para os moradores entenderem que a regras valerão por mais tempo – comenta.
Secretário de Saúde:
Número de pessoas com coronavírus no Rio pode ser dez vezes maior Síndica de um prédio de 25 apartamentos em Botafogo, Celia Seschlobach acredita que a definição dessas diretrizes em lei servirá, sobretudo, para reforçar o que já vem sendo feito por muita gente.
– Entre as medidas que adotamos, pedimos aos moradores que desçam à portaria para pegar as suas encomendas em vez de deixar que os entregadores subam até os seus andares. Isso é fundamental para que haja o menor número possível de pessoas de fora circulando em nossas dependências. Todo o mundo está respeitando, além de ajudar aos mais velhos com o recebimento de entregas, quando necessário – ilustra.
– As pessoas entenderam a gravidade da situação e estão usando o bom senso. Reuniões virtuais O projeto aprovado no Senado também prevê que a assembleia condominial presencial e a respectiva votação dos itens de pauta poderão acontecer, também em caráter emergencial, por meio virtual, até 30 de outubro deste ano. Para Washington Rodrigues, diretor-executivo da administradora de imóveis APSA, que responde por mais de 2.600 condomínios no Rio, é importante que isso faça parte do texto.
Segundo ele, é muito comum que convenções e assembleias sejam feitas justamente nesta época do ano.
– Cerca de 30% da nossa carteira faz isso entre março e abril. É quando definem as diretrizes do ano, fazem prestação de contas e até mesmo elegem novos síndicos – afirma.
– Mas atitudes como a prorrogação da gestão de alguns síndicos já está acontecendo naturalmente. Afinal, é complicado tratar disso agora.
O texto também frisa que “a manifestação de vontade de cada condômino por esse meio (virtual) será equiparada, para todos os efeitos jurídicos, à sua assinatura presencial”. E para quem acha que a transferência desse tipo de atividade para o ambiente virtual é uma tarefa hercúlea, a diretora da Precisão Administradora, Sonia Chalfin, valia que tem dado bastante certo entre os seus clientes.
– As pessoas fazem isso por grupos de WhatsApp ou chats, já que alguns aplicativos comportam conversas entre até 250 pessoas. O que observo é que os moradores estão mais compreensivos diante da gravidade do momento. Querem colaborar para que o condomínio funcione da melhor maneira possível.
Fonte: O Globo